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Solitária e deprimida, personagem Santana da novela "Mulheres Apaixonadas" reflete o drama das alcoolistas que procuram tratamento. Estudo aponta maior risco de suicídio e acidentes fatais entre mulheres que consomem mais de três doses diárias de bebidas alcoólicas.

Um dos temas polêmicos abordados na novela "Mulheres Apaixonadas", da TV Globo, o alcoolismo feminino vem crescendo nos últimos anos. É o que constatam duas especialistas no assunto, Analice Gigliotti e Elisabeth Carneiro, da CLIFad ? Clínica de Tratamento de Fumantes, Alccolistas e Dependentes Químicos, do Rio de Janeiro. Segundo elas, a personagem Santana se assemelha, em muitos aspectos, às alcoolistas que procuram tratamento. É solitária, deprimida e se sente vazia, sem objetivos na vida. A ficção lembra a realidade até no preconceito social que cerca as dependentes. "Talvez se um professor tivesse se jogado em uma piscina, no meio de uma festa, o impacto não teria sido tão grande quanto foi o de Santana se jogando. A professora que bebe é imoral, enquanto o professor que bebe é divertido", comentam Analice e Elisabeth.

Um estudo a que tiveram acesso às duas especialistas apontou um maior risco relativo de suicídio e acidentes fatais entre mulheres que consomem mais de três doses diárias de bebidas alcoólicas. Outros estudos indicam maior ocorrência de alcoolistas entre mulheres com transtornos depressivos e de ansiedade, e entre as que abusam de calmantes. Analice e Elisabeth acreditam que as taxas de prevalência de 1,5 a 2,5% atribuídas, no Brasil, a mulheres alcoolistas não sejam realistas.

"Vários fatores impedem que elas se identifiquem ou procurem auxílio, como discriminação social e baixa capacitação técnica de equipes de saúde para detectar o problema. O alcoolismo feminino se expressa de forma diferente do alcoolismo em homens e nem sempre o seu diagnóstico é fácil", acrescentam.

Em geral, as mulheres começam a abusar do álcool a partir de um evento significativo, como crise no casamento, desestruturação familiar, saída dos filhos de casa, etc. Com os homens não há um desencadeante especial. Elas também são menos tolerantes à bebida e, por isso, necessitam beber menos para sentirem-se embriagadas. Outra característica do alcoolismo feminino é que normalmente a mulher bebe sozinha e dentro de sua própria casa, com receio de ficar estigmatizada.

"Nossa cultura é permissiva com o beber masculino. Acha-se engraçado um homem alcoolizado fazendo brincadeiras ou até se expressando de forma inconveniente na mesa de um bar. Mas a mulher que se comporta da mesma forma rapidamente é rotulada de vadia ou, no mínimo, inadequada. Os bares também não combinam com mulheres bebendo exageradamente", dizem.

Para Analice e Elisabeth, a fronteira entre o uso social, o abuso e a dependência do álcool é muito tênue. "É complicado identificar estas fases porque a sociedade insere a bebida alcoólica em todas as comemorações e atividades de lazer, normalizando porres e excessos e atribuindo estes comportamentos à expressão de felicidade". Em excesso, o álcool pode causar diminuição da atenção, prejuízo do julgamento, irritabilidade, depressão, labilidade emocional, lentificação psicomotora, sonolência, redução do nível da consciência e, eventualmente, coma. Dentre as conseqüências clínicas estão: gastrites, lesão da parede do esôfago, dificuldade de absorção dos nutrientes, hepatite alcoólica, cirrose hepática, insuficiência hepática, pancreatite, alteração do funcionamento cardíaco, arritmias cardíacas, lesões do sistema nervoso central com disfunções motoras, sensitivas e cognitivas, dores musculares, osteoporose precoce, anemias, etc. O abuso do álcool também pode acarretar alterações no ciclo menstrual e prejudicar o desenvolvimento do feto.

Medicamentos

Hoje já existem alguns medicamentos chamados de "anti-craving" que reduzem o desejo de beber e diminuem o sofrimento causado pela síndrome de abstinência. Inúmeros estudos comprovam a eficácia destes novos medicamentos, que reduzem significativamente a chance de um indivíduo sofrer recaídas. Juntamente com o tratamento medicamentoso, as duas especialistas também adotam a chamada Entrevista Motivacional, que auxilia os pacientes a se motivarem para parar de beber ou para resolver a ambivalência quanto à decisão de parar. "Os tratamentos anteriores davam conta apenas dos pacientes que já se encontravam prontos ou motivados para mudar, enquanto que esta nova técnica se aplica a pacientes que ainda não estão plenamente convictos de seu desejo de parar de consumir álcool ou outras drogas, ou seja, a maioria", explica Elisabeth Carneiro, que, além de ser diretora da CLIFad, juntamente com Analice, é supervisora clínica dos setores de Dependência Química e de Dependência à Nicotina da Santa Casa da Misericódia do Rio de Janeiro.

Infelizmente, apesar dos avanços terapêuticos, o alcoolismo não tem cura. Uma vez diagnosticado o problema e após suspender o consumo de álcool, a paciente não deve sucumbir à tentação de beber um único drinque por toda a sua vida. "Nunca dizemos que uma alcoolista está curada, para que ela não deixe de se cuidar e acredite que possa beber socialmente como os outros. O que dizemos é que ela está em recuperação, que tem uma doença controlável como outras doenças crônicas. O diabético para viver bem não deve comer açúcar. Já a alcoolista para viver bem não deve ingerir bebida alcoólica", conclui Analice, mestre em Psiquiatra pela Escola Paulista de Medicina e chefe dos setores de Dependência Química e de Dependência à Nicotina da Santa Casa da Misericódia do Rio de Janeiro.

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