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‘A vida da gente’ se consagra como sucesso

‘A vida da gente’ se consagra como sucesso

23/01/2012


 
Foto: Marjorie Estiano, Rafael Cardoso e Fernanda Vasconcellos: protagonistas de ‘A vida da gente’


Autora estreante em novelas, Lícia Manzo nunca escondeu a sua preocupação por substituir "Cordel encantado", quase uma unanimidade entre público e crítica no ano passado no horário das 18h da Globo. Hoje, esse receio não faz mais sentido. Novelão clássico, com um elenco enxuto e forte ênfase no realismo das cenas e diálogos, "A vida de gente" soube ser original ao transformar os obstáculos naturais do cotidiano no grande vilão da trama. Protagonizado por duas irmãs, personagens queridas pelo público, mas que dividem opiniões, o folhetim chegou ao centésimo capítulo na última quinta-feira, consagrando-se como o novo sucesso desta faixa.

— Existe uma dramaturgia que se nutre de histórias mais fantasiosas, de um "quem roubou o diamante de quem?". Em "A vida da gente", acontecem coisas extraordinárias nos encontros entre as pessoas. É uma novela despretensiosa, com uma leveza mesmo nos temas mais densos. Queria isso claro até no título — explica Lícia.

Dizendo-se inspirada por seriados norte-americanos adolescentes como "Dawson’s Creek" e "Minha vida de cão", a autora também bebeu na mesma fonte dos novelistas Manoel Carlos e Gilberto Braga ao apostar em crônicas cotidianas gravitando em torno de uma trama central bastante melodramática.

— Na novela, os conflitos mais difíceis acontecem entre pessoas dotadas das melhores intenções — diz a escritora ao justificar a falta de um malfeitor que cumpra o papel de semeador da discórdia.

Cúmplices a vida toda, as irmãs Ana (Fernanda Vasconcellos) e Manuela (Marjorie Estiano) se deparam com uma rasteira do destino. Amor de adolescência da primeira, uma tenista de sucesso, Rodrigo (Rafael Cardoso) descobre que teve uma $com a jovem quando ela entra em coma. Ela permanece em estado vegetativo por quatro anos. Nesse tempo, o arquiteto refaz sua vida ao lado de Manu. E divide com ela os cuidados da filha, Júlia (Jesuela Moro). Mas o que construíram juntos é abalado depois que Ana desperta.

O folhetim retrata as delicadas relações entre as novas e variadas configurações familiares. E aborda maternidade, adoção e contrastes entre os sexos. Para o psicanalista e colunista de O GLOBO Aberto Goldin, a novela expõe uma discussão ética muito forte:

— É uma trama bem bolada que coloca questões como "tomar o namorado de uma irmã naquela situação é traição?". Tem uma estrutura na qual o tema principal é o afeto.

O atual afastamento entre Ana e Manuela na história vem gerando debates acalorados entre os telespectadores, que tomam partido de uma ou outra irmã nas redes sociais (leia mais na página 14).

— O Jayme (Monjardim, diretor de núcleo do folhetim) sempre disse que o grande vilão da história seria a vida. E esse foi o tom impresso desde o início — destaca a atriz Ana Beatriz Nogueira, intérprete de Eva, mãe que nutre sentimentos antagônicos pelas filhas: um amor exacerbado por Ana e uma repulsa igualmente forte por Manu. — As personagens não são uma coisa só. As pessoas escorregam, ninguém é bonzinho 100% do tempo — ressalta.

Peça fundamental desta história, Marjorie credita ainda parte da repercussão de "A vida da gente" ao fato de a autora não entregar um enredo óbvio ao telespectador.

— O público esperava a vilania por parte de uma das irmãs para saber como se posicionar. Não estamos acostumados com uma novela que não vem com a receita de quem é bom ou mau. Mas as pessoas se identificam justamente porque a trama trata conflitos familiares de forma sensível, sutil. Ao abordar essas relações, você $com sensações que não são exatas — analisa Marjorie.

No ar desde 26 de setembro, "A vida da gente" registrou até o último dia 12 uma média de 25 pontos de audiência segundo o Painel Nacional de Televisão (PNT) do Ibope. Número bem próximo ao da antecessora "Cordel encantado", encerrada com 26 pontos de média.

— Sinto que a novela está na boca do povo. As pessoas querem comentar a trama até quando estou na fila do hortifruti — observa Rafael Cardoso.

No ar com seu primeiro protagonista, o ator classifica todos os personagens como "muito humanos". O que, em sua opinião, torna a história totalmente plausível.

— A Lícia escreve de forma muito naturalista, $como o Manoel Carlos. A novela é bem feminina, mas os papéis masculinos também têm força. O Rodrigo foi atrás da Ana depois que ela acordou. Ele pode ser um cara indeciso amorosamente, mas é muito coerente com os seus sentimentos — defende o ator.

Depois de flagrar Ana e o marido aos beijos, Manu se sente traída e passa a evitar os dois. Mas não completamente. Ela não pode sair da vida de Júlia, que a trata como mãe.

— Não há certo, nem errado na história. O cotidiano leva a novela. Todos os bate-papos são profundos, falam dos conflitos internos dos personagens. Não há cena de café da manhã que sirva apenas para um passar a manteiga ou o pão para o outro — aponta Fernanda.

A atriz, que tem o cabelo e a maquiagem retocados num camarim antes de voltar ao estúdio, havia acabado de gravar, na cidade cenográfica que reproduz ruas de Porto Alegre, a sequência exibida no capítulo de quinta passada. A cena mostra o breve reencontro entre as irmãs em torno de Júlia. Ainda ferida, Manu evita maiores conversas com Ana.

— A relação entre elas é muito bonita. Em nenhum momento as duas competem por Rodrigo. Ana e Manu são as verdadeiras almas gêmeas — opina Fernanda.

E haja densidade em cena. Apesar de serem abordadas de forma adequada ao horário — mais acostumado a enredos água com açúcar —, as tramas mais profundas de "A vida da gente" muitas vezes remetem às mostradas nos folhetins das 21h.

— A novela tem a mesma discussão do horário nobre ao falar de sentimentos e relacionamentos — acredita Jayme Monjardim, que ambienta os personagens em cenários coloridos e solares para dar um pouco de leveza ao drama mostrado na tela: — Na casa da Iná (Nicette Bruno), onde boa parte das discussões acontece, o sol entra pela janela.

Impressionado com a qualidade vista em "Cordel encantado", o diretor também diz ter buscado uma textura especial para a história de agora.

— Deixo sempre o ator em foco, muito bem iluminado, e o fundo desfocado. Procuro uma proximidade com o olho e a boca dos personagens. Para mim, o grande protagonista desta novela é o texto. Nada pode ser mais importante que isso — informa Monjardim. Goiasnet.com/O Globo  

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