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Em Alto Paraíso, o fim do mundo é o máximo

17/12/2012

O fim do mundo virou conversa de bar em Alto Paraíso. Às vésperas do dia 21 de dezembro, data que, de acordo com o calendário maia, encerra um ciclo de 5.125 anos e marca o fim do planeta, a cidade do interior goiano, encravada na Chapada dos Veadeiros, só pensa nisso. Não é à toa. Cético ou crédulo, difícil é encontrar algum morador alheio ao assunto. A crença de que a localização da cidade pode protegê-la do apocalipse fez a venda de terrenos explodir este ano.
 
As reservas nas pousadas para a próxima sexta-feira estão esgotadas. Com medo de desabastecimento, a prefeitura orientou a população a estocar comida. Até os que não dão bola para a previsão temem que, pelo menos em Alto Paraíso, o mundo acabe de verdade.
 
Cortada pelo paralelo14, que também atravessa Machu Picchu, no Peru, Alto Paraíso fica sobre uma placa de quartzo de quatro mil metros quadrados cercada por rochas e paredões. Os místicos acreditam que a força dos cristais protege a cidade de qualquer Armagedom. A dúvida é o quanto poderá protegê-la da horda de turistas. A prefeitura estima dez mil, numa cidade com sete mil habitantes.
 
O trauma da virada de 1999 para 2000 ainda está fresco na memória local. Naquele ano, uma conjunção inédita de astros também profetizava o fim dos tempos. O resultado foi uma crise de abastecimento nos supermercados e um apagão pela sobrecarga elétrica devido aos três mil turistas.
 
— Algumas pousadas estão contratando gerador de energia — explica o corretor imobiliário Nilton Kalunga, que se prepara para o seu segundo fim do mundo.
 
Outra medida é o estoque de comida, incentivado pela prefeitura. O arquiteto alemão Alexander Potratz, que desde 1976 adota o nome Satya, tem um balde de feijão no porão:
 
— Se o mundo não acabar, eu revendo e ganho em cima. Só não quero ser pego desprevenido — brinca Potratz.
 
A secretária de Turismo de Alto Paraíso, Fernanda Inês Montes, de 23 anos e piercing no nariz, diz que ruas serão interditadas para impedir o grande fluxo de carros. Hospitais próximos foram avisados para reforçar o plantão. O batalhão de polícia deverá aumentar o efetivo. Na dúvida, a secretária aconselha:
 
— Eu mesma tenho comprado velas para o caso de faltar energia elétrica. E, embora não acredite no fim do mundo, minha família, de Minas, vem passar aqui perto de mim.
 
Em parte devido à crença de que só Alto Paraíso vai se salvar, em parte devido à procura de europeus, o preço dos imóveis na cidade disparou: o metro quadrado de terreno dobrou, em média, de R$ 30 para R$ 60, diz o corretor Nilton Kalunga, dono da principal imobiliária da cidade:
 
— Nos últimos 40 dias, as vendas cessaram. Efeito do fim do mundo.
 
Entre as centenas de místicos e religiosos da cidade, poucos creem no fim do mundo no dia 21. Mas acham que não vai demorar.
 
Juiz aposentado e ufólogo, João Tadeu Severo de Almeida comprou o maior hotel da cidade, reformou os 26 quartos e decorou o espaço com bonecos de extraterrestres e luzes estroboscópicas verdes, pertinentes para quem diz ter avistado ETs em duas ocasiões só este ano. Para sexta-feira, preparou uma programação especial: contratou o show de um cover de Raul Seixas para o baile “O dia em que a Terra parou” e comprou um estoque de uísque e cerveja.
 
— Não acredito no fim do mundo para agora, mas acho que está próximo — sentencia.
 
A cidade terá uma programação de shows. O convidado especial será Paulinho Moska, autor de “O último dia” (Meu amor/ O que você faria se só te restasse esse dia?/ Se o mundo fosse acabar...). Artistas locais devem se apresentar. Cigarrilha de palha na mão, cabelos encaracolados compridos, o cantor Júnior Tana, estudioso das profecias maias há oito anos, diz que não será no dia 21 o tão temido momento. Tanto que marcou seu show para o dia 22.
 
Precavido com o primeiro apocalipse frustrado, o corretor Kalunga promete que, para além das grandes catástrofes ou pequenas confusões, uma ida a Alto Paraíso pode virar a cabeça de uma pessoa:
 
— Se você tiver tendência de ser doido, endoida. Se tiver tendência a virar a mão, vira baitola. Se chega macho, fica feroz. Solteiro, casa. Casado, separa. É tudo devido à energia do cristal.

Goiasnet.com/O Globo

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