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Milhares de russos vão às ruas em desafio a lei antiprotestos de Putin

13/06/2012

 


O presidente da Rússia, Vladimir Putin, prometeu nesta terça-feira nunca se curvar a distúrbios sociais, numa resposta às dezenas de milhares de pessoas que tomaram as ruas de Moscou. A manifestação de hoje foi um claro desafio à política mais rígida contra manifestantes adotada por Putin em seu terceiro mandato e ocorre dias depois da assinatura de uma nova lei antiprotestos, que triplica o valor das multas. Com bandeiras do antigo império e da União Soviética, manifestantes gritaram frases como “a Rússia será livre”.

Putin utilizou o discurso sobre o Dia da Independência para aludir a manifestações que atingem alguns países. Mas com tantos moscovitas nas ruas, o destinatário parecia ser outro.

— Não toleraremos decisões e ações capazes de levar a distúrbios sociais e econômicos — disse o presidente, no evento transmitido pela TV. — Não podemos aceitar algo que enfraqueça o nosso país e divida a nossa sociedade.

Segundo o presidente, qualquer mudança política deverá ser baseada “no acúmulo de experiência da estabilidade russa”, uma espécie de slogan que repetiu durante toda a campanha.

Analistas políticos veem os protestos que se repetem desde as eleições legislativas de dezembro como um dos maiores desafios a cruzarem o caminho do presidente desde que ele ascendeu ao poder. Para Putin, no entanto, as manifestações são incitadas por forças externas.

De 20 mil a 100 mil nas ruas, dependendo da fonte

Aos gritos de “Rússia sem Putin!” e “Putin é um ladrão!”, dezenas de milhares de manifestantes participaram nesta terça-feira do maior protesto contra Vladimir Putin desde que o ex-espião da KGB retornou ao Kremlin, em 7 de maio. A participação popular na chamada “Marcha dos milhões” — estimada em cifras bem diferentes pela polícia e pelos organizadores, que vão de 20 mil a cem mil pessoas — foi impulsionada pela aprovação, às pressas, na semana passada, de uma lei que eleva a multa para quem comparece a protestos não autorizados pelo governo para US$ 9.200, um montante superior ao rendimento médio anual dos russos. A realização de uma série de incursões policiais nas casas dos principais líderes da oposição anteontem, em mais um sinal da abordagem linha-dura adotada pelo presidente no início de seu terceiro mandato, também contribuiu para alimentar o ressentimento entre os moradores de Moscou.

Enquanto a multidão participava do protesto pacífico nas ruas, os principais rostos do movimento — como o blogueiro Alexei Navalny; o organizador do protesto, Ilya Yashin; e a apresentadora de TV e socialite Ksenia Sobchak — foram submetidos a sessões de interrogatório, que duraram entre cinco e seis horas, por investigadores federais. Eles foram ouvidos sobre os confrontos entre manifestantes e o batalhão de choque no protesto de 6 de maio, véspera da posse de Putin, que resultaram em cerca de 20 policiais feridos e 400 manifestantes presos.

O único a ignorar diretamente a intimação policial foi o opositor Sergei Udaltsov. Em seu lugar, ele enviou um advogado para explicar aos investigadores que, na condição de principal organizador do evento, seria irresponsável faltar. No palco, gritou:

— Essa é nossa resposta aos criminosos e ladrões: não temos medo!

‘Divisão inaceitável da sociedade’

Navalny é visto como a principal ameaça e deve ser interrogado de novo na quarta-feira. Após seu comparecimento à polícia, as casas de seus pais e de seus sogros e seu escritório foram submetidos a operações de busca e apreensão. As autoridades já haviam levado computadores, telefones e CDs com fotos dos filhos nas buscas realizadas nas casas de líderes da oposição.

A manifestação não contou com alguns dos líderes da oposição, convocados para prestar depoimento à polícia sobre os últimos protestos do dia 6 de maio, contra a posse do presidente. Outros, como o líder da Frente de Esquerda, Sergei Udaltsov, ignoraram a intimação. Udaltsov enviou a mulher ao Comitê de Investigações em seu lugar com uma carta em que explicava que não poderia ir ao interrogatório porque estaria na “Marcha dos Milhões”, como está sendo chamada a primeira grande manifestação desde a assinatura da lei antiprotestos.

Os organizadores da marcha receberam autorização para a participação de até 50 mil pessoas. A nova lei antiprotestos em vigor impõe multas de até 300 mil rublos (mais de R$ 18 mil, quase a média salarial anual dos russos) para quem participar de protestos não autorizados. Udaltsov estimou que 100 mil pessoas participaram da marcha, enquanto a polícia contabilizou 20 mil manifestantes. Barreiras de metal foram instaladas pela polícia em alguns trechos do percurso, mas, de maneira geral, havia menos policiais do que em protestos anteriores. Muitos dos manifestantes carregaram a bandeira preta, amarela e branca do antigo Império Russo, enquanto outros levaram a bandeira soviética.

Os participantes do protesto aprovaram o “Manifesto da Rússia livre”, que exige a demissão dos governantes do país, a dissolução do Parlamento e a preparação de uma nova Constituição. Os opositores propõe limitar os poderes do presidente e reduzir um governo a, no máximo, dois mandatos de quatro anos.

Na segunda-feira, casas de organizadores como Udaltsov, o blogueiro Alexei Navalny e a apresentadora de TV Ksenia Sobchak foram revistadas e tiveram computadores, fotografias, telefones, documentos e dinheiro confiscados. Boris Nemtsov, ex-vice-premier e um dos líderes da oposição ao atual regime, não teve a casa visitada por estar ausente. Ele deve usar a tática de não ir para casa para evitar que lhe entreguem uma intimação judicial.

— As autoridades estão em pânico. Elas estão tentando realizar ações primitivas, repressivas, mas eu tenho certeza de que eles só conseguirão causar o efeito oposto. Esse tipo de buscas incomoda e enfurece as pessoas, e um número maior de pessoas vai às ruas — afirmou Udaltsov, que durante a manifestação recebeu uma intimação para depor ao Comitê de Investigações.

Alguns especialistas concordam com o opositor e encaram os interrogatórios e buscas como uma propaganda para os opositores. Para o analista político Stanislav Belkovski, a população acaba mobilizada ao observar as ações do governo e assim se junta aos opositores no protesto. O líder esquerdista Udaltsov afirmou que o Kremlin quer “aterrorizar o povo” para que os russos fiquem em casa.

Em uma tentativa de enfraquecer a mobilização convocada pelos opositores, as autoridades organizaram vários eventos paralelos para o feriado do Dia da Rússia (que começou na segunda-feira e só termina na quarta-feira). Um show na Praça Vermelha, no início da noite desta terça-feira, era esperado como o ponto alto dos eventos, com a participação de vários músicos russos.

Mas o combate aos organizadores da marcha também incluiu ações mais violentas: na noite de segunda-feira, líderes da província de Vologda se dirigiam para a capital quando foram atacados. O veículo de Yevgueni Dogozhírov, presidente do movimento Juntos e deputado da assembleia legislativa dessa província, foi interceptado por dois automóveis sem placa. Quatro homens saíram, começaram a quebrar os vidros do carro de Dogozhírov e dispararam, aparentemente com pistolas de descarga elétrica, contra os passageiros, que ficaram feridos e tiveram que ser hospitalizados.

Manifestações pró-Kremlin também foram marcadas para esta terça-feira. E enquanto os protestos da oposição ocorriam, Vladimir Putin participou de uma entrega de prêmios no prédio do governo, onde disse que o poder “deve estar aberto a um diálogo constante com a sociedade”. Goiasnet.com/O Globo

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